Mudanças no mercado de gás trazem risco a investimentos e não reduzem preço no curto prazo, dizem analistas

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Mudanças no mercado de gás trazem risco a investimentos e não reduzem preço no curto prazo, dizem analistas

Especialistas afirmam que a ANP poderá interferir no rumo de projetos e que há dúvida sobre efeito das medidas


Lula durante lançamento da Política Nacional de Transição Energética — Foto: Ricardo Stuckert/PR

Porto Velho, Rondônia -
As mudanças no mercado de gás anunciadas pelo governo podem afetar os investimentos futuros no setor e não devem reduzir os preços a curto prazo, de acordo com especialistas. Para Rivaldo Neto, diretor da A&M Infra, os decretos impõem novos riscos aos investidores e aumentam as dúvidas sobre o funcionamento do mercado diante do maior poder da Agência Nacional do Petróleo (ANP) para decidir o valor das tarifas em parte do sistema de distribuição.

— Os decretos podem ser vistos como uma intervenção, mas não há uma definição clara, já que o decreto prevê que a ANP poderá decidir sobre vários aspectos. A ANP ganha poder e, com isso, poderá influenciar o rumo dos projetos. Ou seja, as empresas podem perder autonomia, criando incerteza adicional — diz Neto.

Segundo ele, o mercado tem dúvidas sobre a capacidade de a ANP absorver as novas funções, já que a agência sofre com a falta de mão de obra:

— Existe o risco de paralisia. A ANP já está atrasada em sua agenda regulatória.

Para representantes do setor, o decreto é intervencionista. Uma fonte, que pediu para não ser identificada, ressalta que o decreto contraria o que diz a Lei do Gás. Lembra que hoje as tarifas de escoamento (da plataforma em alto-mar até a costa) e de processamento (nas unidades de tratamento de gás) são negociadas entre as empresas, já que não se trata de monopólio natural como no transporte do gás. E avalia que há risco de judicialização.

Bruno Armbrust, sócio da consultoria ARM, cita que os decretos preveem o aumento da oferta de gás, mas não abordam a redução da concentração do maior produtor do país, a Petrobras, responsável por cerca de 70% da venda do gás.

— A venda de gás pela PPSA (estatal criada pelo governo para vender a parcela da União nos campos do pré-sal no regime de partilha) é uma boa iniciativa, mas deveria ser feita por meio de leilões dirigidos aos consumidores livres. Os decretos não abordam qual será o tamanho da concorrência ou onde se quer chegar.

Parcela da PPSA

Armbrust também questiona a estrutura da ANP:

— Todas essas medidas podem limitar os investimentos no setor. O decreto prevê ainda que a ANP terá o controle do planejamento de entrada de GNL (gás natural liquefeito) no Brasil. Se o aumento da oferta vier pela Petrobras, não haverá mudanças relevantes na concentração de mercado.

Os leilões que serão realizados pela PPSA para vender o gás também terão impacto limitado a médio e longo prazos nos preços, apontam especialistas. Hoje, o consumo industrial é de 30 milhões de metros cúbicos por dia. A PPSA estima que, em 2030, a produção a ser leiloada é 2,9 milhões de metros cúbicos diários.

— O volume será insuficiente para alterar o quadro atual — afirma Neto.

O advogado Giovani Loss, sócio de Infraestrutura e Energia do Mattos Filho, avalia que há risco de eventuais confrontos comerciais entre Petrobras e PPSA. Para ele, a resolução do governo, como está sendo estruturada, traz leitura de certa intervenção no setor:

— Mesmo tendo objetivo nobre, que é reduzir o preço do gás através da competição, resta saber se a competição vai ser a preço de mercado. Se o governo usar a PPSA para fazer política, com precificação artificial, vai haver prejuízo à atuação de outras empresas que estão estruturando projetos com a política de preço atual, e até projetos de importação de gás — diz.

Por isso, afirma o advogado, há receio de que o benefício de curto prazo (redução de preço) possa se transformar em problemas de médio e longo prazos. Para ele, será essencial avaliar se houve equilíbrio entre interesse público e mercado.


Fonte: O GLOBO

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