Analistas veem novo ciclo de alta de juros e 'compromisso' do BC contra a inflação

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Analistas veem novo ciclo de alta de juros e 'compromisso' do BC contra a inflação

Decisão unânime em elevar a Selic a 10,75% é considerada uma 'sinalização boa' por economistas

Sede do Banco Central do Brasil — Foto: Andressa Anholete/Bloomberg

Porto Velho, Rondônia -
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil elevou ontem a Selic em 0,25 ponto percentual, de 10,50% para 10,75% ao ano. Esse é o primeiro aumento da taxa básica de juros no terceiro mandato presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva e vai na contramão dos Estados Unidos, que deram o pontapé inicial no processo de cortes após quatro anos (leia na página 18), na chamada “superquarta”.

A decisão foi tomada por unanimidade no comitê, que atualmente é liderado pelo presidente Roberto Campos Neto, alvo frequente de críticas de Lula — que indicou quatro dos nove atuais diretores. O movimento de aperto da Selic ainda coincide com a primeira reunião após a indicação do atual diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, à presidência do órgão no ano que vem. Ele ainda será sabatinado e precisará ter seu nome aprovado pelo Senado.

No comunicado, o BC deixou claro que iniciou um ciclo de alta de juros, mas não quis se comprometer com o ritmo de aumento nem com a magnitude total do ajuste, abrindo a porta para novas altas. A próxima reunião será em novembro.

“O ritmo de ajustes futuros na taxa de juros e a magnitude total do ciclo ora iniciado serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerão da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”, afirma o comunicado.

Roberto Campos Neto e Gabriel Galípolo, atuais presidente e diretor de política monetária do BC — Foto: Luisa Penna / Editoria de Arte

O que dizem analistas?


Depois do comunicado de ontem do BC, a sinalização é a de que se torna mais provável um ritmo acelerado de alta de juros no Brasil, disseram economistas ao GLOBO.

— O comunicado é duro e seria bastante compatível com uma alta de 0,50 ponto na próxima reunião — disse o economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira, destacando que a questão do consenso deve ficar clara na ata.

O economista-chefe da Truxt Investimentos, Arthur Carvalho, ressaltou que o BC não se comprometeu com um ritmo gradual nem com o tamanho do ciclo:

— O Copom disse que vai fazer o que for preciso para garantir a convergência da inflação para a meta. Nesse sentido, mostra uma disposição diferente, inclusive, do ciclo que levou a Selic de 2% para 13,75% (entre 2021 e 2022), em que falavam em pequeno ajuste ou indicavam que a Selic ficaria abaixo do nível neutro (que não acelera nem segura a inflação) ou acima. Naquela época, nunca falavam que iriam fazer o necessário.

Para Carvalho, o comunicado duro do Copom em meio à transição entre Campos Neto e Galípolo mostra que o indicado de Lula está querendo mostrar comprometimento com a missão de colocar a inflação na meta:

— Se alguém ainda tem dúvida, ele está querendo mostrar que está altamente comprometido. Não só ele, mas o comitê. Mostra união do comitê. A sinalização é boa.

Com a alta de ontem, o Brasil subiu da terceira para a segunda posição num ranking de juros reais com 40 nações elaborado pelo economista Jason Vieira, do site MoneYou. Agora só está atrás da Rússia.

Primeira alta em dois anos

O BC brasileiro não subia os juros desde agosto de 2022, quando a Selic chegou a 13,75%, patamar em que permaneceu até junho do ano passado.

Ao justificar a decisão, o Copom destacou que o cenário atual é marcado por resiliência na atividade econômica, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo (economia acima do seu potencial), elevação das projeções de inflação e expectativas de IPCA distantes da meta. Isso, segundo o Copom, demanda “uma política monetária mais contracionista”.

Citação inédita desde 2015


O hiato positivo indica que a economia está operando acima de sua capacidade, geralmente com utilização total de recursos, o que pode gerar pressões inflacionárias. Desde junho de 2015 o BC não citava o hiato do produto positivo em seu comunicado sobre a Selic.

Após a surpresa com o aumento de 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, a autoridade monetária avaliou que o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho tem apresentado dinamismo maior do que o esperado.

Esse foi um dos fatores que levou o balanço de riscos para a inflação a ficar assimétrico em direção a uma alta. Ou seja, o BC avalia que há um risco maior de a projeção atual para a inflação ficar mais elevada do que está. Sobre as contas públicas, o Copom afirmou que monitora com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros.

A projeção oficial do BC para a inflação no horizonte relevante — atualmente, o primeiro trimestre de 2026 — é de 3,5%, já bastante acima do centro da meta, que é de 3%.

O mercado já projetava uma alta da Selic por conta de sinalizações feitas pelo próprio BC. Após a reunião de julho, Galípolo liderou o discurso duro de combate à inflação entre os membros do Copom, em contraste com sua postura anterior, na avaliação de agentes do mercado financeiro.

A mudança do discurso de Galípolo foi bem avaliada, uma vez que o grande receio do mercado era que ele não resistisse às pressões do governo por juros mais baixos. Desta vez, o próprio Lula havia “liberado” um movimento de aperto monetário (que esfria atividade econômica). Em entrevista, o presidente disse que, se Galípolo o procurasse ser preciso aumentar os juros, diria: “Aumente.”

Haddad: sem surpresas

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, evitou comentar a decisão e disse que vai esperar a ata, que será publicada na terça-feira, antes de se pronunciar:

— Não me supreendi. Mas só vou comentar a decisão depois da leitura da ata, na semana que vem, como de hábito. Vou dar uma olhada, vou conversar internamente sobre o que esperar para um futuro próximo.

Haddad comentou a decisão do Federal Reserve (Fed), que, segundo ele, veio depois do esperado:

— Nós estávamos esperando para junho o corte do Banco Central americano, teve uma pequena turbulência no começo do ano. Mas agora deve entrar numa trajetória de cortes e deve ser duradoura, o que é ótimo para o Brasil e para o mundo. Isso dá um alívio doméstico grande.

(Colaborou João Sorima Neto)


Fonte: O GLOBO

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